Por: Paula Farias e Suevelin Cinti
No hall de entrada, um grupo de dez mulheres conversa, é segunda feira,
dia da oficina de jardinagem. Mães de filhos já crescidos, com família formada
e, ainda sim, carentes de convivência. São essas mulheres que buscam
reencontrar aqui sua auto-estima perdida entre os afazeres domésticos, as
dificuldades financeiras e a opressão diária que sofrem por simplesmente serem
mulheres. Enquanto o professor não chega, elas falam sobre tarefas de casa,
folheiam revistas e dão risadas entre uma brincadeira e outra que fazem para
passar o tempo.
Na recepção, já é possível notar as particularidades do local, com uma
decoração em tons de branco e roxo nas paredes, móveis estofados, mesas de
vidro, prateleira com artesanatos. Existe um tratamento diferenciado entre a
recepcionista e as mulheres que ali chegam, um largo sorriso estampado no rosto
torna a chegada muito mais agradável e convidativa.
Aqui, quebra-se o padrão da maioria dos órgãos públicos. Uma fachada
discreta, com uma placa pequena. Estamos no Centro de Cidadania da Mulher de
Santo Amaro, o CCM.
A sensação é a de ter entrado na sala de estar em casa, cada detalhe foi
pensado e planejado para acolher de forma aconchegante essas mulheres. São
sofás cobertos de almofadas com capas artesanais bordadas à mão, cores alegres
nas paredes forradas de quadros e flores por todos os lados.
Algumas das mulheres que estão ali tentam retornar ao mercado formal de
trabalho, outras nunca tiveram sequer a carteira assinada. Entre elas as
experiências são as mais diversas possíveis, e foi pensando nessa pluralidade
que as atividades da CCM foram organizadas.
Oferecendo as mais variadas oficias e cursos gratuitos, é desta maneira
que o CCM de Santo Amaro torna seu espaço útil. Presente em outros países
além do Brasil é uma criação da União Europeia, responsável pelo monitoramento
de dados em relação à situação das mulheres nos países onde existe os centros.
Desde sua inauguração, em 2007, quem mantém o funcionamento do espaço é a
Prefeitura de São Paulo através da Secretaria de Participação e Parcerias.
Entre os cursos mais procurados estão: arte e movimento, costura,
artesanato, rodas de leitura, confecção de sacolas, atendimento jurídico e
psicológico, rodas de bate papo, desenvolvimento pessoal e cuidados pessoais.
No CCM se aprende que não existem limitações físicas, e sim culturais.
As mulheres querem mais opções de escolha e acabar com esse preconceito social
de que há trabalho só para homens ou só para mulheres.
Em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI)
já houve um curso de texturização e pintura em parede, que também ajudou
muitas mulheres a conquistarem espaço no mercado de trabalho como pedreiras.
Para este ano está previsto novo curso de hidráulica e de elétrica, também na
área civil.
As oficinas e cursos são ministrados por profissionais de forma
voluntária, por esse motivo a programação varia muito durante o ano. Cada curso
dura em torno de dois a três meses, e a mulher que desejar pode repetir o mesmo
curso.
A voz dos beneficiados
Dona de uma audição apurada e memória quase fotográfica, Maria da Paz
perdeu a visão dos dois olhos em conseqüência de uma doença genética, assim
como seu irmão. Porém, diferente dele e por ser mulher, ela não teve o mesmo
empenho da família em habilitá-la para ser independente.
Maria foi então procurar ajuda na Unidade Básica de Saúde (UBS), em Veleiros,
na qual era usuária. Ela buscava um lugar que oferecesse reabilitação, para que
pudesse andar sozinha e ser menos dependente, e foi conversando com Suely
Schraner, que trabalha no Centro Gestor da unidade, que juntas elas encontraram
o CCM.
Suely acompanhou todo o processo de desenvolvimento de sua nova
companheira, juntas elas participaram de oficinas de dança e arte em cabaça.
Emocionada, Maria da Paz conta que foi na oficina de cabaça que encontrou a
grande chance de desenvolver mais uma habilidade e oportunidade de superação:
“A emoção foi demais quando, pelos olhos da professora Valéria, fiquei sabendo
que a minha pintura (Chuva Americana) na cabaça tinha ficado muito bonita.
Chorei de alegria”
Suely completa a fala da amiga: “acompanhá-la é a melhor maneira de
agradecer por ter uma boa visão”.
Aprendendo a SER
A coordenadora do local, Rosangela Fogarolli conta que o espaço atende
mulheres de todas as idades e regiões, algumas vindas por encaminhamento da
Delegacia da Mulher para serem orientadas e outras que buscam uma ocupação.
Todas as mulheres, antes de começar as aulas, passam por um curso de
“Formação de gênero, política e cidadania”, com uma assistente social e uma
estagiária, com duração de quatro a cinco encontros.
É nesse momento que o Centro de Cidadania busca desenvolver sua
principal função no enfrentamento à violência doméstica e reconhecimento da
mulher na sociedade, fazê-la perceber que muitas vezes seus desejos e vontades
são anulados para sustentar a família unida e seu casamento, motivos que a
leva, na maioria das vezes, suportar a opressão e a violência dentro de sua
própria casa.
Segundo Rosângela, falar de gênero com esse público é ir além da
diferenciação de sexo ela diz que o fundamental é fazer as mulheres
compreenderem que as grandes limitações que temos são questões culturais, de
nossa própria criação. A coordenadora afirma que ao longo das palestras as
mulheres se dão conta da violência da qual são vítimas, que, na maioria das
vezes não é física e sim psicológica (que quando envolve o fato de ser mulher é
considerada violência de gênero).
Rosângela resume ainda a sociedade em que vivemos: “Uma sociedade
masculina, machista e feita para homens”, declara, afirmando que essa visão
também pertence às mulheres e que é para isso mesmo que realizam seu trabalho
sistêmico, vindo ao encontro desse problema cultural.
“O nosso dia a dia é muito emocionante, se a gente consegue o retorno de
uma dessas mulheres já está de bom tamanho. Lutamos hoje não pela igualdade e
sim pela equidade, para que não haja mais o
opressor ou o oprimido, e que se a mulher desejar ser dona de casa, seja ela
respeitada por sua escolha”, afirma.
Trabalho maravilhoso dessas pessoas, e a força dessas mulheres é imensa, quando elas pensam que não, mais ir atrás de ajuda é um enorme passo, ver mulheres assim que conseguem ter sua auto estima renovada deve ser um ganho enorme para estes profissionais, sua matéria ficou ótima Paula parabéns!
ResponderExcluirAss: Sara Donato